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domingo, 24 de abril de 2011

Pra onde vai o lixo?

Quando retornei pra casa, estava exausto, cansado.
Eu havia subido e descido toda aquela montanha de lixo por mais de 6 horas seguidas, o cheiro que no início era sufocante, depois duas horas nem sequer o  sentia.
Sem falar no chorume. Havia mais chorume do que água e por todo lado que se olhava: chorume nos tanques e canais de captação , uma lagoa de chorume,  a estação de tratamento de chorume; chorume dentro do mangue no entorno da cota zero e por fim no carro pipa que para abaixar a poeira dos caminhões que circulavam sem parar , passava durante todo o dia espalhando uma mistura de água salgada bombeada da lagoa Rodrigues de Freitas com o chorume dos tanques de  captação.
Voltei a sentir aquele cheiro quando cheguei em casa. Minha calça , uma bota de couro e minha camisa, foram todos para um saco preto de lixo. Jamais usei novamente aquelas roupas!


Estava cansado e impressionado, se me peguntassem sobre o inferno, talvez poderia dar uma pista, mas dificilmente imaginaria algo pior do que aquele lugar para descrevê-lo.
 
Por outro lado, as pessoas estavam felizes de certa forma, trabalhavam como se fosse um emprego como outro qualquer, parecia uma grande linha de produção. Vendo por este lado,  não poderia então chamar aquilo de inferno!
Ai meu Deus, maldita pergunta que me fizeram naquele dia: Matheus , pra onde vai o lixo?


O dia inteiro procurando meu primo entre os catadores.
Depois de 6 horas já me sentia em casa, como um deles.
No ônibus de volta pra casa, eu só pensava em todo aquele cenário , minha cabeça estava girando, só conseguia enxergar lixo e  minha boca não parava de repetir baixinho aquela pergunta: Pra onde vai o lixo? Pra onde vai o lixo? Pra onde vai o lixo?


Eu sei, é trágico mas foi empolgante. Provavelmente , se eu voltar lá por mais algumas vezes posso começar, quem sabe , a ver a beleza da coisa e entender melhor como aquele povo todo vive dessa forma.


Única coisa que me desviava desses pensamentos era o simples fato que no dia seguinte teria prova de ciências, no primeiro tempo.
Será que vou ficar muito impressionado e não conseguir dormir? Esse é meu drama , pior que não conseguir estudar é não conseguir dormir no dia antes da prova; se assim for, sei que estarei um bagaço de laranja! Huuumm...bagaço não...ví uma menina pegando um bagaço dentro de um saco de lixo e do jeito que estava ela comeu...aargh...vai ser uma noite longa!


Quando cheguei em casa, senti algo diferente, tomei um banho frio e demorado, queria esfregar até a alma para tirar toda aquela sensação. Me preparei para comer algo, peguei o pão que sobrou de manhã, passei margarina, e quando fui ao quintal dei de cara com a lata de lixo.
Eu só queria um pouco de paz, mas fui surpeendido por algo ao olhar para aquela lata que reforçava os acontecimentos daquele dia:


-Respeito com o lixo!


Caraca, parecia que a lata falava comigo, quase dei uma gargalhada, mas comecei a pensar no respeito que eu deveria ter com o lixo a partir daquele dia!
Foi como um estalo, eu sabia que aquela viagem ao mundo do lixo mudaria minha vida , mas não sabia como essa mudança se daria , sabia que não poderia ser o mesmo, mas quando me vi frente a frente com o meu próprio lixo a coisa foi diferente:
-Respeito com o lixo! Mas como assim?


Pensei nas milhares de pessoas que vivem do meu lixo, tirando dele o sustento de suas famílias e trabalhando de forma tão precária, aí imaginei que se eu mesmo cuidasse melhor do meu lixo, com carinho e respeito, essas pessoas poderiam retirar dele o que lhes interessar de maneira mais fácil...


Por hoje chega...
Preciso dormir... amanhã tem prova.

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